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Livro do jornalista Laurentino Gomes conta a história camuflada do triângulo amoroso entre Marechal Deodoro, Gaspar Silveira e a Baronesa do Triunfo, pivô da Proclamação da República
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Nelson Gonçalves, especial para a Foha2Uma mulher, que teria sido amante do Marechal
Deodoro da Fonseca, foi o pivô para a proclamação da República no
Brasil. Foi, segundo alguns pesquisadores da história e autores de livros, a
dor de cotovelo e os ciúmes que fez Marechal Deodoro saltar de madrugada da cama
para empunhar a sua espada e proclamar a República, destituindo Dom Pedro 2º do trono. O militar sempre foi seu fiel escudeiro e amigão do imperador.
Deodoro, inocentemente, acabou sendo envolvido
numa rede de mentiras, boatos político-militar, criados pelos republicanos defensores
dos chamados “barões do café”, descontentes com a abolição dos escravos, ocorrida
um ano antes da proclamação da República. Se não fosse isso, talvez o país
estaria até hoje ainda sendo uma monarquia parlamentarista.
Maria Adelaide Andrade Neves Meireles ficou viúva
aos 34 anos. Era rica, inteligente e bonita, conhecida na história como a Baronesa
do Triunfo, teria atraído a paixão de Marechal Deodoro quando ele governou o
Rio Grande do Sul, em 1833. Mesmo casado, o militar costumava avançar sobre o
sexo oposto. Ele perfumava a barba com fragrância de lavanda, espetava um
vistoso anel no dedo mínimo de sua mão direita e costumava escrever pequenos
versinhos, ou simplesmente “cantadas”, nos leques que costumava presentear mulheres,
as quais sexualmente cobiçava.
Seu rival, Gaspar Silveira Martins, senador gaúcho, era um galanteador nato que
recitava Shakespeare de cor. Mas quis o destino que ele tivesse um acidente
desastroso e se aproximasse ainda mais da baronesa. Ele caiu do cavalo, próximo
da casa dela, e quebrou a perna. Ficou um mês sob os cuidados de Maria Adelaide,
em sua casa em Rio Pardo. E depois disso ele viajava, disfarçado, de trem de
Porto Alegre a Rio Pardo para ficar com a baronesa.
De acordo com o livro “Uma Luz para a História do
Rio Grande”, a mulher nascida em Porto Alegre em 1838 costumava interceder
junto aos comandantes para aliviar penas impostas aos jovens militares por
falhas de menor importância. Além disso, protegia alunos militares ameaçados
por trotes dos colegas mais velhos.
Relatos da época indicam que, além de bela, Maria
Adelaide era inteligente, articulada, líder atuante nos bastidores da política
da região e defensora dos jovens, que estudavam na Escola Militar, localizada diante
de sua casa em Rio Pardo, no Rio Grande do Sul. Deodoro se sentia atraído por
ela. Perfumava sua barba com lavanda e tentou várias investidas para galantear
a viúva bonita. Mas Maria Adelaide escolheu Gaspar Silveira Martins, antigo
rival do marechal no amor e na política. Ambos se tornaram praticamente inimigos
mortais.
Uma fake News na República
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Marechal Deodoro da Fonseca caiu numa fake-news contada pelos republicanos para ele se ir contra o imperador Dom Pedro 2º e proclamar a República no Brasil |
Os destinos de Deodoro e Silveira Martins
voltariam a se cruzarem seis anos depois, nos eventos que culminaram na instauração
do regime democrático. Tanto Deodoro como Silveira eram, na verdade, defensores
da monarquia e amigos de Dom Pedro 2º. Deodoro era o chefe do exército e
Silveira senador, líder do imperador no Congresso. Os dois eram, até então monarquistas.
Dias antes do episódio da proclamação da República,
tinha sido deposto o chefe do gabinete da Corte: o mineiro Afonso Celso de
Assis Figueiredo, conhecido na história como Visconde de Ouro Preto. Marechal
Deodoro tinha participado da quartelada que derrubou Visconde de Ouro Preto e,
adoentado, volta para casa. No entanto o senador Benjamin Constant informa que Gaspar Silveira
Martins, desafeto de Deodoro, teria o escolhido por Dom Pedro 2º para suceder Visconde de Ouro Preto na chefia do gabinete. Era mentira. Se fosse em tempos atuais poderíamos
dizer que o Marechal Deodoro caiu numa fake News, acreditando piedosamente numa
inverdade.
“Ai já é demais”, teria exclamado o Marechal
Deodoro que não aceitava ver um inimigo, que o chamava pejorativamente de “sargentão”,
como primeiro-ministro. Ele pula da cama, embainha sua espada e segue para
frente do Palácio Imperial, onde aos gritos Proclama a República, destituindo
do trono Dom Pedro 2º. No dia seguinte, o marechal, que até então defendia fervorosamente
o regime monárquico, concorda em assinar o decreto que institui o governo
provisório republicano.
Ciúmes doentio
O pouco conhecido episódio do ciúme doentio do
Marechal Deodoro pela Baronesa do Triunfo também simboliza a tortuosa gênese
republicana do Brasil, que produz até hoje seus efeitos na vida pública do
país. Uma das primeiras atrapalhadas da instalação da República foi o concurso para a escolha de um novo Hino Nacional, que acabou não escolhendo hino e novo e se gastou muito dinheiro para organizar o evento.
Maria Adelaide morreu em Porto Alegre (RS), aos 91
anos, quatro décadas após o enciumado Deodoro proclamar a República. Deodoro
assumiu o governo provisório e logo em seguida foi eleito presidente. Mas não
chegou a concluir o mandato. Pressionado e temendo o início de uma guerra
interna, renunciou ao cargo de presidente no dia 23 de novembro de 1891,
deixando o cargo para o vice-presidente Marechal Floriano Peixoto.
Com a deposição de Dom Pedro 2º, Gaspar Silveira Martins
partiu para o exílio na Europa. Não queria ser retaliado por Deodoro. Retornou ao
Brasil em 1891 e passou a criticar os republicanos, por ele chamados de “ditadores
contistas”. Chegou a propor uma reforma constitucional para adoção do
parlamentarismo.
Declaradamente monarquista, Silveira Martins
tentou, sem sucesso, para que Dom Pedro 2º retornasse ao Brasil, após Marechal
Deodoro ter fechado o Congresso Nacional. Também chegou a propor à Princesa Isabel
que autorizasse seu filho mais velho para ser aclamado como Dom Pedro 3º para
governar o Brasil. Diante da recusa da princesa, afirmando que era muito
católica e não queria mais confusão, indignado Silveira respondeu: “então,
senhora, seu destino é o convento”.
Silveira Martins chegou a participar de movimentos
separatistas no Rio Grande do Sul e após ser derrotado na disputa pelo governo daquele estado
mudou-se para o Uruguai, onde faleceu, em 23 de julho de 1901, aos 65 anos, num
quarto de hotel em Montevidéu.
Deodoro da Fonseca, que coincidentemente nasceu em
5 de agosto, mesmo dia do nascimento do seu rival Silveira Martins, mas era
oito anos mais velho que o rival. Ele faleceu a exatamente nove meses depois de ter
renunciado à presidência da República, em 1892, aos 65 anos de idade.
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O senador Gaspar Silveira Martins, que era oito anos mais novo e muito galanteador, acabou levando a melhor e ficando com mulher pela qual Marechal Deodoro nutria grande paixão |
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