Folha2

Você sabia que Pernambuco foi um país independente por 74 dias ?

Vitral no Palácio Campos da Princesa, sede do Governo de Pernambuco, mostra a revolução de 1817 em marcha

Nelson Gonçalves, especial para a Folha2

Pernambuco foi um país independente por 74 dias. Isso ocorreu no ano de 1817.  Esse período ficou conhecido como Revolução Pernambucana, ou Revolução dos Padres. Assim como a Inconfidência Mineira e a Conjuração Baiana, foi um movimento de caráter separatista e independente que ocorreu durante o período colonial no Brasil. 

A grande diferença desse grande movimento iniciado em Recife é que a Revolução Pernambucana conseguiu de fato superar a fase conspiratória e chegou a tomar o poder local por mais de dois meses. A difusão dos ideais de liberdade, que deu base ao movimento, foi propiciada 21 anos antes, em 1796, quando surgiu a Areópago de Itambé, nome da primeira loja maçônica do Brasil.

O Areópago significa no sentido figurado o tribunal de sábios e pessoas eminentes. Essa loja maçônica foi um projeto político, pautado na luta pela igualdade, liberdade e fraternidade. Fundada pelo paraibano Manuel Arruda da Câmara (1752-1810), que se formou médico e botânico estudando nas universidades de Coimbra, em Portugal, e em Montpellier, na França. Ele também foi ordenado padre no Seminário de Goiânia (PE), adotando o nome de Frei Manuel do Coração de Jesus. E foi um dos pioneiros a trazer para o Brasil os ideais da Revolução Francesa (1789-1799).

A localização do Aerópago foi estratégica, pois Itambé estava na divisa entre Pernambuco e Paraíba, dois estados bastante prósperos na época. Os areopagistas, os maçons da época, dotados de sabedoria exemplar, se reuniam e após o fim da reunião cada um levava para sua casa os objetos, artefatos, símbolos e insígnias para não deixarem vestígios e levantar suspeitas. Em 1802 tropas da Guarda Imperial fizeram uma devassa na região, prendendo os maçons, acusados de conspiração contra a Corte portuguesa. Os que não foram presos, fugiram para Recife.

República Pernambucana

O comerciante Cruz Cabugá foi um dos líderes da Revolução Pernambucana e depois foi o primeiro embaixador brasileiro nos Estados Unidos


A Revolução Pernambucana eclodiu em 6 de março de 1817, quando o brigadeiro português Manoel Joaquim Barbosa de Castro foi assassinado ao tentar realizar, por ordem do governador local, a prisão de supostos envolvidos em uma conspiração que visava o movimento separatista. O assassinato foi cometido pelo capitão José de Barros Lima, que reagiu à voz de prisão realizada pelo brigadeiro. Os revoltosos tomaram o palácio. O governador Caetano Pinto de Miranda Montenegro fugiu de Recife para o Rio de Janeiro. Os rebeldes, vitoriosos, implantaram o Governo Provisório que decretava a independência de Pernambuco e instituía diversas mudanças.

De imediato proclamaram a República na Capitania de Pernambuco. Estabelecia a liberdade de imprensa e a liberdade de credo. Os impostos criados por Dom João 6º foram abolidos e instituíram o princípio dos três poderes. A frente desse movimento estavam o capitão José de Barros Lima e os comerciantes Domingos José Martins, Antônio Gonçalves da Cruz, conhecido como Cabugá, e o Padre João Ribeiro, entre outros líderes.

Apesar de ser um movimento de caráter liberal, as medidas tomadas pelo Governo Provisório visavam beneficiar muito mais as elites locais do que necessariamente promover a criação de uma sociedade mais justa e igualitária. A manutenção do trabalho escravo foi uma evidência disso, já que faziam parte desse movimento grandes latifundiários que eram contrários à abolição.

Rapidamente a Revolução Pernambucana se espalhou pelas capitanias vizinhas e ganhou apoios. Em menos de 10 dias já tinha a adesão da Paraíba e do Rio Grande do Norte e intenções do Ceará de se juntar ao novo país. As lideranças do movimento enviaram emissários para diferentes capitanias e também para países vizinhos à procura de obter apoio. Cruz Cabugá, por exemplo, foi enviado para os Estados Unidos com 800 mil dólares para comprar armas, contratar soldados e obter o apoio do governo americano para nova república que se formava na América Latina.

Repressão da Corte

Dom João 6º mandou enforcar e fuzilar os detratores da sua Corte com medo de perder o poder sobre as terras brasileiras


Entretanto não demorou muito tempo para a Corte portuguesa se reorganizar para combater a Revolução Pernambucana. A repressão foi violenta. Dom João 6º mobilizou uma frota de navios de guerra, que sai do Rio de Janeiro para bloquear o porto de Recife. Além disso, mais de quatro mil soldados foram enviados da Bahia e marcharam para Pernambuco.

O movimento enfraqueceu por causa de divergências internas entre as lideranças, o que permitiu que as tropas da realeza retomassem facilmente o controle sobre a Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Em Pernambuco, a revolta resistiu até 20 de maio de 1817, quando os líderes se renderam ao general Luís do Rego Barreto, após a cidade de Recife ser invadida e tomada pelas tropas da Corte portuguesa.

Ao todo, nove pessoas foram enforcadas em praças públicas para servirem de exemplo para que ninguém mais ousasse a praticar movimento semelhante. Outras quatro pessoas foram encaminhadas para fuzilamentos públicos. Um dos envolvidos, Padre João Ribeiro, enforcou-se pouco antes de ser capturado. 

Cruz Cabugá, recebendo as notícias do fracasso do movimento, não retornou ao Brasil e permaneceu nos Estados Unidos, sendo inclusive depois nomeado pelo imperador Dom Pedro 1º como o primeiro embaixador brasileiro nos Estados Unidos. A carga com os cercas de 1.000 fuzis que ele tinha adquirido para a revolução foi interceptada pelos soldados portugueses no porto de Recife e nunca chegou nas mãos dos revolucionários.

O grande líder da revolta, Domingo José Martins, foi arcabuzado. O capitão José de Barros Lima foi enforcado e teve as mãos e a cabeça decepadas e coladas em exposição, dependuradas em postes, e seu corpo foi arrastado pelas ruas de Recife. Fizeram a mesma coisa com o corpo do Padre João Ribeiro. Entre os que foram presos e anos depois também enforcados ou fuzilados estava Joaquim da Silva Rabelo, conhecido como Frei Caneca.

Confederação do Equador

Frei Caneca participou da Revolução Pernambucana e da Confederação do Equador

Frei Caneca veio a ser em 1824, quase dois anos depois da proclamação da Independência do Brasil por Dom Pedro 1º, um dos líderes de outra revolução separatista que ficou conhecida como Confederação do Equador, também eclodida em Recife, Pernambuco. Em 2 de julho de 1824, novamente os líderes pernambucanos romperam com o poder central por discordarem com uma série de medidas impostas pelo imperador. Anunciaram a formação de uma nova república: a Confederação do Equador.

Pediram a adesão de outras províncias do Norte e Nordeste. O movimento, no entanto, não obteve o apoio necessário. A aprovação dos países estrangeiros, a princípio esperada, também não foi adiante. E o movimento acabou sufocado, depois de muitas lutas sangrentas.

Todos os líderes do movimento foram presos, levados à julgamento e executados. Após ser preso não demorou nem seis meses para Frei Caneca ser julgado e condenado à forca. Depois que três carrascos se recusaram a enforca-lo ele foi amarrado na haste da forca e um pelotão de soldados encapuzados fizeram o fuzilamento dele.

Bandeira

Bandeira da República de Pernambuco que inspirou a bandeira do Estado

A bandeira da República de Pernambuco de 1817 foi criada pelo pintor Antônio Alves. Era branca com um arco-íris, representando a diversidade étnica e ideológica, uma cruz, simbolizando a participação dos padres na história do estado, o Sol simbolizando a força e energia do local e três estrelas no alto, simbolizando a união das capitanias de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. 

A bandeira da República de Pernambuco foi hasteada pela primeira vez em 1º de abril de 1817. Ela serviu de inspiração para a bandeira oficial do Estado de Pernambuco.


Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem

vários

Folha2
Folha2