Contas do ex-prefeita de Queiroz teve contas com várias irregularidades
A ex-prefeita de Queiroz,
Ana Virtudes Miron Soler, a Tuti (PV), teve parecer prévio desfavorável do Tribunal
de Contas do Estado (TCE) para as contas de 2020, último ano de sua
administração. Em um longo parecer, com 34 páginas, o conselheiro Sidney
Estanislau Beraldo relatou diversas irregularidades constatadas na
administração da ex-prefeita.
Entre as irregularidades
apontadas estão desde o pagamento de horas extras de forma habitual, inclusive
para servidores que estavam afastados para concorrer nas eleições de 2020, bem
como discrepâncias nos pagamentos de adicionais de insalubridade e permanência
de servidores aposentados no quadro de servidores. O relatório também apontou
desvio de funções, adiantamentos irregulares, despesas com publicidade e
propaganda em período eleitoral e falta de detalhamento de despesas nas contas
da prefeitura.
Segundo o tribunal, a ex-chefe
do Executivo foi devidamente notificada e advertida, por várias vezes, pela
fiscalização sobre as irregularidades. “Os relatórios de controle interno não
demonstraram atuação do setor em relação aos atos e despesas destinados ao
combate à pandemia do coronavírus”, escreveu o relator, acrescentando que a
prefeitura não implantou o serviço de ouvidoria, não ampliou a participação
popular na elaboração das peças orçamentárias, haja visto que sequer
disponibilizou à população o serviço de coleta de sugestões no site da casa.
Os quadros da Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO) não foram
publicadas e nem disponíveis na internet, conforme determina a legislação em vigor.
“Não houve a elaboração da ‘Carta de Serviço ao Usuário’, o que pode comprometer
a transparência e o acesso simplificado do atendimento público à comunidade”.
A administração da
ex-prefeita, segundo o tribunal, também não elaborou plano de contingência, bem
como não realizou medidas de contingenciamento em face das consequências
econômicas da pandemia de covid-19. A fiscalização do TCE apurou a inexistência
de um plano de enfrentamento à covid-19, a deficiência na contabilização de valores
arrecadados, ausência de informações sobre participantes em viagens e atraso
nas prestações de contas.
Viagens estranhas
Com relação as viagens o problema é mais agravante ainda. Segundo o tribunal, as despesas com combustíveis eram diferentes daquele com o qual o veículo foi abastecido (diesel x etanol/gasolina) e houve, por diversas vezes, atraso na devolução de valores não utilizados. Em uma das viagens os comprovantes de pedágio indicavam gastos apenas no sentido de “retorno” e por trajeto incompatível com o destino descrito no empenho da viagem.
De acordo com o relatório,
a ex-prefeita prevaricou no exercício do cargo ao não efetuar nenhum
procedimento de cobrança relativo aos valores inscritos em dívida ativa, seja
judicial ou extrajudicial. A fiscalização constatou ausência de protestos, bem
como da inscrição dos inadimplentes em órgãos de proteção ao crédito, tais como
SPC e Serasa.
No setor da Educação a
fiscalização do tribunal constatou que o piso salarial nacional dos
profissionais do magistério não foi pago, em desatendimento à Lei nº
11.738/2008. Além disso, constataram que a creche municipal não possuía sala de
aleitamento materno, contrariando Portaria do Ministério da Saúde, além de não
possuir espaço lúdico, tampouco brinquedos no pátio. Os veículos da frota
escolar estavam com mais de 10 anos de fabricação e nem todos estavam em boas
condições de uso.
Sem plano de carreira
A prefeitura também não
apresentou Plano de Carreira, Cargos e Salários (PCCS), contrariando a
legislação vigente. Não houve atingimento da meta de cobertura para a maioria
das vacinas obrigatórias em crianças. E os agendamentos das consultas não
respeitaram o intervalo mínimo de 15 dias.
As nomeações excessivas
para cargos de chefia e supervisão também foram apontadas como irregularidades cometidas
pela ex-prefeita Tuti. “As atribuições para as funções, além de bastante
sintéticas e genéricas, uma vez que não se vinculam especificamente a nenhuma
seção ou setor, não se revestem de caráter de confiança que deve nortear as
nomeações em comissão”, escreveu o relator Sidney Beraldo.
“Número excessivo de
cargos em comissão, havendo casos de mais de um(a) funcionário (a) ocupando o
mesmo cargo, dentro de uma mesma estrutura, ferindo o princípio da razoalidade”,
escreveu o relator. “Servidores foram designados para exercer função diferente
daquela para as quais foram contratados”.
Horas extras para quem estava afastado
No tocante ao pagamento
habituais de horas extras a servidores a situação apontada pelo TCE é mais grave ainda, pois
alguns além de receberem quantias fixas mensais, ultrapassando inclusive o
limite de duas horas diárias, podendo resultar em eventuais desembolsos por
parte da administração por conta de ações trabalhistas. A fiscalização anotou
que tinha servidor recebendo, de forma irregular, o pagamento de três horas
extras diárias. Tambe´m anotou o pagamento de horas extras por três meses a
servidores afastados de suas funções para poder concorrer às eleições
municipais. Ou seja, o servidor era candidato a vereador, fazia campanha e
continuava recebendo horas extras, sem realmente trabalhar.
Alguns servidores receberam,
também de forma irregular, adicional de insalubridade sem que o seu cargo
conste como apto para receberem tal benefício, atestado por Laudo Técnico das
Condições de Trabalho (LTCAT). Alguns chegaram a receber 30% como adicional de
periculosidade, sem ter direito a esse benefício.
Outra irregularidade
apontada pela fiscalização foi o fato de a prefeitura, na gestão da ex-prefeita
Tuti, manter em seu quadro de pessoal 11 servidores já aposentados,
contrariando o Estatuto Municipal dos Servidores, que determina a vacância do
cargo em caso de aposentadoria, bem como já existe jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal (STF) em recentes decisões.
Os gastos com publicidade
e propaganda superaram a média dos dois primeiros quadrimestres dos três
últimos anos. A prefeitura empenhou gastos com propaganda a partir de 15 de
agosto de 2020, quando entrou em vigor o período eleitoral e era proibido pela
legislação. Outra observação importante constante no relatório do TCE é que a
prefeitura além de não ter participado de nenhum programa de educação ambiental
não possuía sequer Plano Municipal e nem Plano Regional de Saneamento Básico. E
não realizou, segundo relatório do tribunal, relatórios sobre a qualitativa e
quantidade de resíduos sólidos urbanos gerados no município. O relator do TCE
também apontou que não foi criada a Coordenadoria Municipal de Proteção e
Defesa Civil (COMPDEC) ou órgão similar que fosse responsável pela execução,
coordenação e mobilização de todas as ações de defesa civil no município. “A
prefeitura não capacitou seus agentes para ações municipais de Defesa Civil”,
anotou o relator.
Defesa
Em sua defesa, os
advogados da ex-prefeita disseram no processo que as falhas apontadas podem ser
relevadas em razão de diversas situações fáticas que contribuíram de forma
decisiva para suas ocorrências. Entre elas, justificam, a carência de receitas
financeiras e recursos humanos no quadro de pessoal, especialmente nos casos
que exigem maiores conhecimentos técnicos.
No entanto o Ministério
Público de Contas (MPC) opinou pela emissão de parecer desfavorável à aprovação
das contas. O MPC destacou a ineficiência do controle interno dos gastos, com
reincidências em impropriedades apontadas em anos anteriores, comprometendo a
efetividade dos serviços prestados. Também apontou a excessiva quantidade de
cargos em comissão, em dissonância com as condições gerais estabelecidas pela
Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), bem como os pagamentos de horas extras
habituais e não trabalhadas, sendo reincidentes em mais de um mês.
A ex-prefeita também
encaminhou documentação complementar para tentar justificar as irregularidades
cometidas em sua gestão. Alegou, em síntese, que em razão da pandemia
ocasionada pela covid-19, não foi possível implementar medidas saneadoras em
diversos setores da administração, mas que providências foram tomadas visando o
exato cumprimento das normas em vigor.
Em relação ao dispêndio
com horas extras, defendeu que a grande maioria dos pagamentos ocorreu em
função do atendimento a situações emergenciais na área prioritária da saúde,
como o transporte de pacientes para hospitais em outros municípios,
argumentando que o atendimento em Queiroz restringe-se somente à atenção básica.
E ressaltou que as contas dos seus três primeiros anos de administração foram
todos aprovadas.