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A cachaça da boa é produzida em Cedral no sítio de um dentista

 

O dentista Toninho, de Cedral, se tornou especialista em produzir cachaça artesanal

Antônio da Câmara Filho é cirurgião dentista, formado há 40 anos pela Faculdade de Odontologia de Araçatuba (FOA), mas há 15 anos se especializou em produzir cachaça. Ele faz tudo de forma totalmente artesanal, desde o plantio da cana-de-açúcar, no sitio de 3 alqueires da família, até o engarrafamento do produto.

Toninho como é mais conhecido em Cedral, cidade onde ele vive e nasceu, conta que a produção da cachaça no sitio da família iniciou-se com o seu sogro, Alceu Marcato, de forma bastante rudimentar. “Ele foi visitar alguns alambiques na região e resolveu que iria produzir sua própria pinga para consumo”.

Com a morte do sogro, o dentista, já bastante renomado, resolveu assumir o controle da produção da cachaça e se apaixonou pelo alambique. Participou de inúmeras feiras e eventos de produtores de cachaça em distantes lugares e, além de apreciador, se tornou especialista na produção da bebida.

“Conheço todos os segredos para se produzir uma boa cachaça”, afirma, revelando que ele acompanha tudo, desde o plantio e colheita da cana até o envase, feito de forma manual e sem nenhum maquinário sofisticado. A produção é pequena. Não chega a 100 litros a cada dois dias.  “Aí está o nosso diferencial, que garante a qualidade”, explica.

No pequeno alambique, localizado no bairro rural do Cedro, distante a menos de 2 quilômetros do centro de Cedral, Toninho produz cachaças artesanais com quatro diferentes sabores, envelhecida em tonéis de 700 litros: carvalho, amburana, jequitibá e de amendoim. Não acrescentamos nenhum tipo de corante ou produto químico na cachaça para mudar a coloração e sabor. O que muda a cor e o sabor é a madeira do barril onde ela é envelhecida.

 O sitio onde Toninho produz sua cachaça artesanal é exemplo de auto sustentabilidade. Ali nada é perdido. Tudo é aproveitado. As sobras não poluentes da produção de cachaça, como o bagaço, a ponta e o caldo de cana, são utilizadas na alimentação do gado e porcos.

 E como produtor ele ensina que os grandes apreciadores de cachaça sempre afirmam que a bebida deve ser consumida pura, ou seja, sem nenhum tipo de mistura que venha alterar o seu sabor original e inigualável.  “A qualidade é o maior diferencial da nossa cachaça, para a qual estabelecemos rigorosos critérios de excelência”, ressalta, explicando que ela difere da pinga comum usada para fazer caipirinha com limão. “Ela pode ser comparada a um uísque de alta qualidade”.

 Antes consumida pelo preço, hoje determinados tipos de cachaça são bastante requisitados. Em eventos finos, a cachaça artesanal é tão apreciada quanto uísques, champanhes e vinhos de marcas famosas.

 História da cachaça

 A cachaça, bebida derivada da cana-de-açúcar, influenciou significativamente o processo histórico do Brasil.  Assim como o carnaval, o futebol e a feijoada, a cachaça tem sua imagem totalmente associada ao povo brasileiro.

 A cana-de-açúcar, matéria-prima básica para a obtenção da cachaça e de vários tipos de álcool é originária da Ásia. Em 1502, as primeiras mudas de cana chegaram ao Brasil, trazidas por Gonçalo Coelho, navegador português. E a primeira cachaça teria sido destilada em 1516 no litoral de Pernambuco. Há registros de alambiques em Itamaracá e Igarassu em Pernambuco. Em Porto Seguro, na Bahia, e de um alambique no litoral paulista, conhecido como Engenho do Governador, que tinha entre seus proprietários Martim Afonso de Souza.

 Os primeiros relatos sobre a fermentação da garapa, extraída da cana, vem dos egípcios que curavam suas moléstias inalando o vapor dos líquidos aromatizados e fermentados. Os gregos também registraram o processo de produção de “água ardens”, a água que pega fogo, com propriedades místico-medicinais a quem era atribuída a longevidade das pessoas.

  Os árabes produziam a aguardente misturada com anis, tornando-se a bebida mais popular na Ásia. A tecnologia desenvolvida pelos árabes na destilação espalhou-se pelo mundo, influenciando na produção de bebidas como o Sakê de arroz, no Japão, o Kirsk de cereja na Germânia, a Palinka na Romênia e a Bagaceira em Portugal.

 Dia da Cachaça

 O Dia Nacional da Cachaça foi criado em 2009 pelo Ibrac (Instituto Brasileiro de Cachaça). O 13 de setembro foi escolhido em homenagem à data em que a cachaça foi oficialmente liberada para a fabricação e venda no Brasil, em 1661, após uma rebelião. Nessa época a rebelião ocorrida no Rio de Janeiro, conhecida como a Rebelião da Cachaça, levou à legalização da bebida, proibida até então pela Corte Portuguesa que desejava propagar a sua Bagaceira.

 Os produtores da cachaça ainda buscam o reconhecimento e a valorização da cachaça como produto típico e símbolo nacional.  Para o diretor executivo do Ibrac, Carlos Lima, a bebida ainda é uma grande desconhecida da população. “O brasileiro ainda não conhece a versatilidade, a riqueza que existe por trás da bebida”, afirma. “Ainda existe aquela marginalização da cachaça e um grande preconceito. As pessoas ainda preferem beber outros tipos de bebida porque acham que dá mais glamour do que beber uma bebida de qualidade, que é um produto exclusivo do Brasil”.

 Mapa da Cachaça

 Para divulgar a cultura e a história que envolve a cachaça, um destilado genuinamente brasileiro, o publicitário Felipe Jannuzzi e alguns colegas criaram, em 2010, o Mapa da Cachaça, um site com guias, receitas e artigos sobre a bebida.

De acordo com Felipe, a paleta de sabores da cachaça se dá pela diversidade de madeiras utilizadas no seu envelhecimento. Ele explica que a bebida pode ser tomada branca depois da destilação ou passar por madeiras.

“O mundo inteiro faz isso com carvalho, uma madeira do hemisfério norte”, explica Felipe. “A cachaça pode passar pelo carvalho, mas também por mais de 30 madeiras brasileiras. Isso está muito ligado à acessibilidade dessa madeira nos locais de produção”.

Na Paraíba, por exemplo, a madeira freijó é muito utilizada. Em Salinas, Minas Gerais, é o bálsamo. Em São Paulo e no interior do Rio de Janeiro se usa o jequitibá ou uma madeira chamada amendoim.

 Tributação cara

 De acordo com o Ibrac (Instituto Brasileiro da Cachaça são mais de 6,3 mil marcas registradas, entre cachaça e aguardente. O setor gera cerca de 600 mil empregos diretos e indiretos.

Carlos Lima, diretor do Ibrac, destaca também a cadeia produtiva por trás da cachaça, desde a geração de renda e fixação do homem no campo. E avalia que, apesar do grande mercado da cachaça, o volume exportado está muito aquém do potencial.

Os investimentos no setor esbarram na alta carga tributária, que chega a 82% para a cachaça. Segundo o Ibrac, a inclusão de pequenas empresas do setor no Simples Nacional, regime tributário simplificado, em 2016, deu um alento, mas grande parcela dos produtores trabalha na informalidade por causa da elevada carga tributária no setor.

 

Cachaça do Cedro é produzida de forma artesanal num sitio em Cedral
Aos finais de tarde Toninho costuma receber clientes e amigos para degustação do produto diretamente da bica dos toneis

Mauro Marques da Silva, especialista e conhecedor profundo de cervejas, também aprecia a qualidade de uma boa cachaça

Toninho também vende o produto a granel, em embalagem mais econômica para os clientes que gostam de armazenar a cachaça em pequenos corotes de madeira

Uma antiga tulha do sitio serve agora para a guardar dos barris e tonéis de cachaça

O engenheiro Ubirajara Silveira Garcia já é antigo freguês do alambique

A cachaça do Cedro é produzida em quatro aromas:carvalho, jequitibá, amendoim e amburana

Norival Alves Tosta e Esmeraldo Ferrato são fregueses antigos e apreciadores da cachaça

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