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Sacramento: berço de Hipólito da Costa e pedaço da história luso-brasileira

Colônia do Sacramento é a cidade mais antiga do Uruguai. E assim como o país inteiro, ela já pertenceu à Portugal e ao Brasil, antes da independência do Uruguai


 

Nelson Gonçalves, especial para a Folha2

A cidade de Colônia do Sacramento, no Uruguai, guarda em seu solo um capítulo especial da história da América do Sul e do jornalismo brasileiro. Localizada no extremo oeste do Uruguai, às margens do rio da Prata, a cidade fica a cerca de três horas de carro de Montevidéu, a capital uruguaia, e a uma hora de barco de Buenos Aires, na Argentina.

Sacramento, assim como todo o Uruguai, pertenceu ao Brasil durante parte do período colonial e imperial, quando as disputas entre portugueses e espanhóis pelas terras do sul do continente moldaram fronteiras e identidades. Nesse cenário de conflitos, trocas e influências mútuas entre culturas, nasceu nesta cidade uma das figuras mais importantes da imprensa brasileira: Hipólito José da Costa Pereira Furtado de Mendonça, considerado como o patrono da imprensa brasileira.

 Hipólito José da Costa foi um pioneiro no jornalismo do Brasil e um defensor incansável da liberdade de expressão. Jornalista, diplomata e maçom, ele fundou e editou o “Correio Braziliense”, o primeiro jornal brasileiro, publicado em Londres a partir de 1808 — justamente quando a imprensa era ainda proibida em território nacional. Por meio de suas páginas, Hipólito criticava o absolutismo, defendia ideias iluministas e propagava os ideais de liberdade e progresso, influenciando gerações de pensadores e políticos. O jornal circulou até sua morte, em 1823, um ano após a proclamação da independência do Brasil. Hipólito foi preso e perseguido pela Coroa Portuguesa. Em razão disso pediu asilo político e se naturalizou como cidadão na Inglaterra. Ele faleceu aos 49 anos de idade sem saber que tinha acabado de ser nomeado, por Dom Pedro 1º, como cônsul do Império brasileiro para a cidade de Londres.

 A Colônia do Sacramento, com sua arquitetura colonial, ruas de pedra e rica herança cultural, testemunhou diferentes bandeiras tremularem em seus fortes. Mas é no legado de seus filhos ilustres, como Hipólito, que a cidade eterniza sua importância. Sacramento não é apenas um ponto no mapa. É um símbolo da luta pela liberdade e da formação da identidade brasileira e sul-americana. Foi o primeiro marco de habitação naquela região. Montevidéu somente surgiu quase 50 anos depois da fundação de Colônia do Sacramento. 

 Revisitar a história de Sacramento é mais do que relembrar disputas territoriais. É reconhecer o valor de suas raízes e de personalidades que, como Hipólito da Costa, ousaram ir além dos limites impostos pelo tempo e pelo espaço, para escrever — literalmente — os primeiros capítulos da nossa liberdade de imprensa.

A cidade histórica com mais de 345 anos mantém as ruinas de sua fundação


 História de Sacramento

Alguns anos após o descobrimento do Brasil, uma expedição comandada por Martin Afonso de Souza, fundador da cidade de São Vicente (SP), chegou com suas caravelas até estuário do rio da Prata com a missão de colocar marcos de posse portuguesa na margem esquerda da foz daquele rio. Entretanto não pode completar a missão em razão do naufrágio de sua embarcação.

Assim, logo em seguida outra expedição comandada pelo português Manuel Lobo fundava em 22 de janeiro de 1680 a Colônia do Santíssimo Sacramento, fazendo fronteira com Buenos Aires na margem oposta do rio da Prata. A ocupação do território, entretanto, não foi muito pacífica entre portugueses e espanhóis que lutaram pelo poder daquelas terras. Em 1705 a Espanha tomou Sacramento para si até 1715, quando os portugueses, após intensa batalha, voltaram a dominar aquele espaço. Com o intuito de marcar território os espanhóis fundaram, quase 50 anos depois, em 1724, a cidade de Montevidéu, que mais tarde viria a ser a capital do Uruguai, e impediram o erguimento de novas construções em Sacramento.

Acordo diplomático

Em 1801 através de negociações diplomáticas, assinado entre Portugal e Espanha, a paz foi restabelecida entre as duas nações e a Colônia de Sacramento voltou a ficar sob domínio português. Cinco anos mais tarde os espanhóis voltaram a dominar e ocupar o comando da cidade. Em 1817, a Colônia do Sacramento voltou à posse de Portugal, quando o rei Dom João 6º, pai de Dom Pedro 1º, incorporou toda a região do Uruguai aos domínios de Portugal no Brasil.

Com a independência do Brasil, em 1822, a Colônia do Sacramento, assim como todo o Uruguai, num território conhecido como Cisplatina, passou a fazer parte do novo país, até 1828, quando a população local fez um levante e autoproclamou, com ajuda dos argentinos, a República Oriental do Uruguai. Seu último comandante foi o brigadeiro Manuel Jorge Rodrigues, que somente abandonou o comando da cidade, após o estabelecimento da Convenção em que o Brasil reconhecia o Uruguai como uma nova nação.

Ruas com calçamentos de pedra foram tombadas como Patrimônio Histórico da Humanidade


 Cidade de 27 mil habitantes

De lá para cá, Colônia do Sacramento não cresceu muito. Se mantém atualmente com cerca de 27 mil habitantes e preserva até hoje sua arquitetura com prédios que mostram uma mistura única entre as tradições portuguesas e espanholas. A cidade foi tombada, em 1991, pela Unesco como Patrimônio Histórico da Humidade. Possui calçamento de pedra e várias casas antigas portuguesas, além de algumas espanholas. As portuguesas se distinguem facilmente por seus telhados a duas ou quatro águas.

Na área central está a Praça do Gentil-Homem, que tem esse nome em homenagem ao jornalista Hipólito da Costa (1774-1823), filho ilustre da cidade. Ele foi o fundador do primeiro jornal brasileiro, o “Correio Braziliense”. Nasceu numa casa defronte a praça e viveu em Colônia do Sacramento até os 3 anos de idade, quando sua família se mudou para Pelotas, no Rio Grande do Sul. Seu pai era o alferes português Felix da Costa e sua mãe, Ana Josefa Pereira, era natural de Colônia do Sacramento. Várias placas comemorativas destacam o personagem ilustre. Na cidade tem também museus espanhóis e portugueses, além do famoso Museu dos Azulejos.

A balsa que faz a travessia Buenos Aires- Colônia do Sacramento é um navio de luxo


 Travessia em balsa de luxo

 A travessia de balsa entre Buenos Aires, na Argentina, e Colônia do Sacramento, no Uruguai, é muito mais do que um simples deslocamento. É uma experiência digna de um cruzeiro de luxo. Operada por empresas modernas e eficientes, a balsa que faz esse trajeto em cinco horários diferentes ao longo do dia (entre 8h30 às 20h30) impressiona pela estrutura gigantesca, conforto e serviço de alto padrão oferecidos aos passageiros. O preço para fazer a travessia também assusta um pouco aos brasileiros: um carro com duas pessoas custa em torno de R$ 1.200.

 A balsa compensa e vale muito a pena. Primeiro porque quem deseja sair de carro de Buenos Aires para Sacramento se optar ir rodando pelas rodovias terá de enfrentar mais de 700 quilômetros de trânsito e gastará muito mais com tempo e combustíveis. Pensando bem sai mais barato usar a balsa. 

 Uma dica importante é que ao sair de Buenos Aires não escreva no GPS a palavra “balsa”, pois isso levará o motorista para um dos bairros mais pobres perigosos da capital portenha. Escreva “Colônia Expressa”, que é o nome do terminal portuário ultra moderno, localizado estrategicamente ao longo de um elegante cassino, o que já dá o tom do requinte da viagem.

Logo na entrada, o passageiro é recepcionado com organização e cordialidade. Ao adentrar a balsa por meio daquelas “sanfonas”, idênticas as existentes nos aeroportos, que conecta o terminal com a embarcação, também chamadas de ponte telescópica, finger, jet bridge ou jetway, o passageiro já se depara com funcionários uruguaios bem trajados e bastante sorridentes dando as boas-vindas aos turistas.

 Ao adentrar na balsa, após passar por todo um sistema de imigração, onde são verificados passaportes e bagagens passando pelo Raio X, a sensação é de estar num navio de luxo. Salões climatizados e acarpetados, assentos espaçosos, serviço de bordo com lanchonete, duty free shop e até área VIP, além de janelas panorâmicas que proporcionam uma vista deslumbrante do rio da Prata durante toda a travessia, que demora 1 hora e 15 minutos. O caminho, apesar de balançar pouco por causa das ondas, é suave e bem tranquilo.

 Cruzar o rio da Prata entre essas duas cidades sul-americanas é, portanto, muito mais que uma simples viagem. É um passeio que une conforto, beleza e história, com a sofisticação de quem embarca praticamente em um hotel flutuante.

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Colônia do Sacramento, assim como todo o Uruguai, pertenceu ao Brasil no passado

Cidade Colônia do Sacramento ainda preserva veículos e tradições do passado 

Local onde pode se obter informações turísticas do Uruguai 

Pequenos restaurantes e bares são pontos turísticos em Colônia do Sacramento

Mapa mostra a localização da travessia da balsa que faz a ligação com Buenos Aires

Jornalista Nelson e o filho Renzo. Ao fundo o rio da Prata e o Cassino de Buenos Aires

Porta de entrada para ingresso na balsa Colônia Expresso

Colônia Express é a  porta de entrada para o ingresso no Uruguai para quem sai da Argentina

Lateral da Balsa Colônia Express, que faz a travessia do rio da Prata

Passageiros podem desfrutar de  poltronas confortáveis e de uma vista maravilhosa



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