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Filme “Sebastião Leme, o fotografo inventor” estreia em Rio Preto

Cartaz do filme que retrata a vida e a obra de Sebastião Leme


Nelson Gonçalves, especial para a Folha2

Tivemos o prazer de assistir, nesta última quarta-feira, dia 29 de maio, em São José do Rio Preto, a pré-estreia do filme “Sebastião Leme, o fotografo inventor”. Foi a segunda apresentação do filme, produzido pelo cineasta Rodrigo Grota, que reside em Londrina (PR). A primeira ocorreu no dia 24 de março no Cine Esmeralda, em Marília, em uma sessão avant-premiere destinada à imprensa local. 

Um misto de emoção e recordações tomou conta de nossos olhos e coração ao vermos imagens de prédios e locais que marcaram a nossa infância e adolescência na cidade de Marília. Pudemos ver no filme até mesmo uma provável fotografia nossa que fizemos da família Leme reunida numa festa de final de ano. Nossos pais moravam perto da casa que Sebastião Leme mantinha na rua Pedro de Toledo, atras do Colégio das Freiras do Sagrado Coração de Jesus. Estávamos na festa e um dos filhos nos deu a máquina fotográfica, num tempo em que ainda não existia o temporizador nas teleobjetivas, para que registrássemos o patriarca, sua esposa e todos os familiares ali presentes. Tivemos o privilégio de fotografar o fotografo. 

O filme é um documentário que narra a trajetória do fotografo Sebastião Carvalho Leme, falecido em 2007 aos 89 anos. Ele foi um dos pioneiros da imprensa mariliense e criador da câmera fotográfica que captava imagens em 360 graus. Ele contou, num vídeo para a Comissão de Registros Históricos da Câmara Municipal de Marília, que criou a máquina de precisão em cima de uma lata de massa de tomate.

Sebastião Leme foi para a cidade de Marília a mesma importância histórica que tiveram os fotógrafos Jaime Colagiovanni e Edson Baffi para o município de São José do Rio Preto. Tudo ele registrava com sua câmera fotográfica ou filmadora. Assim manteve e deixou um vasto acervo com mais de 25 mil registros, ao longo de 60 anos de trabalho. Seu acervo mostra, por seis décadas, o crescimento da cidade. Suas fotografias registram a construção dos primeiros edifícios, a pavimentação asfáltica das primeiras ruas da cidade, a chegada das autoridades de Estado na cidade, os bailes das debutantes e inúmeros acontecimentos históricos.

Fama na televisão

Para se ter ideia da importância de Sebastião Leme na década de 1970 ele participou do programa Cidade Contra Cidade, apresentado por Silvio Santos, na extinta TV Tupi. Durante o programa ele fez uma foto com sua máquina de 360 graus. Silvio Santos gostou tanto da fotografia que o contratou para produzir inúmeras fotografias de suas empresas. Sua aparição na televisão também lhe proporcionou inúmeros outros contratos com prefeituras e empresas de várias cidades de todas as partes do Brasil.

Nascido em Guará, na região de Ribeirão Preto, seus familiares contam que uma máquina fotográfica 4x6, encontrada pelo pai numa estrada, foi que lhe despertou seu enorme interesse pela arte fotográfica. Aos 12 anos de idade ele ficou surdo e praticamente precisou usar, pela vida toda, aparelhos auditivos para poder ouvir e se comunicar. Aprendeu a fazer leitura labial e para isso contava com a ajuda dos seus sete filhos. Sempre um dos filhos o acompanhava para ajudar a traduzir e compreender o que os outros falavam.

Mas a surdez não foi fator impeditivo para suas criações. Desde muito jovem se tornou um inventor nato. Projetou máquinas para colher amendoim e moer café. Estava sempre engenhando alguma atividade ou criando produtos. Ele também atuou certo período como protético onde aprendeu a necessidade de precisão nos detalhes. 

Em 1948 ganhou Medalha de Ouro no Primeiro Salão de Belas Artes de Marília com a tela pintada a óleo “Engenho da Formosa". No começo dos anos de 1950 foi contratado pela Companhia Cinematográfica Vera Cruz e trabalhou num dos primeiros clássicos do cinema nacional, o filme “Caiçara”. "A equipe técnica era formada por estrangeiros e eu era o único brasileiro", contou ele, em depoimento para a Comissão de Registros Históricos da Câmara Municipal.

Em 1951 presenteou o presidente Harry Truman, dos Estados Unidos, com um álbum fotográfico durante a 41ª convenção do Rotary Internacional. Em 1956 foi contratado pela Associação Paulista dos Municípios para registrar e produzir o álbum fotográfico que foi doado ao prefeito de Nova Iorque, Robert F. Wagner. Em 1958 ele publicou a “Revista Marília”, abordando aspectos econômicos, políticos, culturais e sociais da cidade. Tanto as fotografias, como os textos na revista eram de sua autoria.

No final dos anos de 1950, Sebastião Leme fez três viagens à Brasília, enfrentando as estradas sem asfalto com uma perua Kombi, onde levava seus equipamentos de fotografia e revelação. É de sua autoria as primeiras e, com certeza as únicas, fotografias em 360 graus da construção de Brasília.  

Em 1970 quando ainda não existia a fotografia colorida, ele desenvolveu uma técnica em que permitia realizar experimentos para colorir as fotografias em preto e branco. Nessa época também produziu inúmeros textos de teor jornalístico e literário, publicado nos jornais e revistas locais.

Sebastião foi integrante da Ordem Rosacruz, da Loja Maçônica Brasil II e um dos fundadores, em 1963, da Loja Maçônica 9 de Julho, em São Paulo, que posteriormente se tornou uma das lojas maçônicas mais importantes do Brasil. Ele também foi membro do Rotary Clube de Marília. Mas sempre atuou de forma discreta. Maurício Leme, um dos filhos, já falecido e que acompanhou a profissão do pai, contava que ele somente soube que o pai era maçom depois de adulto.

Filme

 Fernando Alves Pinto interpreta no filme o papel de Sebastião Leme

O cineasta Rodrigo Grota, que dirige o filme sobre Sebastião Leme e sua obra, foi vencedor de vários prêmios, entre os quais o do Festival de Cinema de Gramado (RS). Na obra, o fotografo inventor é interpretado pelo ator Fernando Alves Pinto, de 54 anos, que já trabalhou em produções como “Terra Estrangeira (1995), “Dois Coelhos” (2012) e “Nosso Lar” (2020). A direção fotográfica foi realizada por Carlos Ebert, que carrega em seu currículo clássicos como “O Bandido da Luz Vermelha” (1968), “Fé” (1998) e “O Rei da Vela” (1983). Iam Rodrigues, um dos produtores do filme, conta que o filme curta-metragem foi produzido com uma verba governamental de apenas R$ 25 mil. “Praticamente ninguém ganhou quase nada”, revela.

Mais de 70 profissionais de diferentes áreas, desde pesquisadores, arquivistas, bibliotecários, jornalistas, profissionais de audiovisual e outros profissionais da economia criativa se juntaram para construir esse filme durante três anos. O longa-metragem, com 40 minutos de duração, teve apoio do ProAC (Programa de Incentivo à Cultura) da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativa do Governo do Estado de São Paulo.

Acervos de diferentes instituições, como o Clube de Cinema de Marília e da Comissão Organizadora dos Registros Históricos da Câmara Municipal e da Cidade de Marília, foram disponibilizados para que o núcleo de pesquisas trabalhasse, sob a coordenação da bibliotecária e historiadora Wilza Matos.

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Jornalista Nelson Gonçalves pouco antes da estreia do filme

Fotografias em 360 graus de Brasília, feitas por Sebastião Leme

Parte do acervo fotográfico deixado por Sebastião Leme


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