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Avenida Sampaio Vidal, a principal via do distrito de Dirceu, que pertence à Marilia |
Nelson Gonçalves, Especial para a Folha2
Distante a 8 km do perímetro
urbano de Marília e a 3 km da rodovia SP-333 (Rod. Dona Leonor Mendes de
Barro), que dá acesso à BR-153 (Rod.Transbrasiliana), o distrito de Dirceu está
completamente abandonado e esquecido pelas autoridades municipais e estaduais.
Para começar não existe sequer estrada pavimentada para chegar até a sede do
distrito. Quando chove é um “deus-nos-acuda!”. A avenida Sampaio Vidal, a
principal do distrito, está praticamente intransitável, devido as imensas
crateras e valetas que se abriram por toda sua extensão. O local parece viver
tempos de guerra, após ter sido bombardeado por misseis poderosos e
destrutivos.
Saindo da avenida Brigadeiro
Eduardo Gomes, em Marília, para chegar até o distrito, os motoristas precisam
atravessar três pinguelas de madeira, que causam medo só de ver o estado
precário em que se encontram. No ano passado uma delas chegou a ser levada pelas
águas das chuvas e deixou o distrito incomunicável. O percurso, do condomínio
Santa Gertrudes, no bairro Aeroporto, em Marília, até Dirceu é de apenas 8 km.
Mas se for dar a volta, passando por várias ruas, avenidas e semáforos, por
dentro da cidade, o trajeto do percurso triplica para 33,9 km.
O subprefeito de Dirceu, Amador Barbosa, que reside no distrito de Rosália, onde também já foi subprefeito, diz que também não sabe mais a quem recorrer. “Vamos ver se agora que a cidade de Marília está com dois deputados na Assembleia Legislativa (Vinicius Camarinha e Dani Alonso) a gente consegue recursos para a pavimentação para a estrada”. Segundo Amador, numa crítica velada aos políticos, “diz a lenda que essa estrada já foi, no passado, pavimentada e recapeada um monte de vezes, mas só no papel”. Ele informa que conseguiu três caminhões de pedras, mas que agora falta chegar um trator patrola para esparramar essas pedras pela estrada. Segundo o último Censo, a área urbana possui 124 moradores e ao todo, incluindo a área rural, não passa de 600 habitantes.
Os distritos dispõem
obrigatoriamente de cartórios de ofícios de registro civil. No caso de Dirceu
nem isso possui mais. Marília possui seis distritos (Lácio, Nóbrega, Amadeu
Amaral, Avencas, Rosália e Dirceu) e é uma das cidades com maior número de distritos no Estado.
Se iguala a Campinas e Itapetininga. Mas perde em quantidade para Mogi das
Cruzes e Piracicaba (com sete distritos) e para a capital paulista, com 96
distritos. Em termos de área, Marília se posiciona em 22ª posição com 1.170 km²,
área quase três vezes maior do que a cidade de São José do Rio Preto, que
possui 431 km². A cidade de Rancharia, que faz parte da região, se posiciona na
6ª posição no Estado com área de 1.584 km², um pouco na frente de São Paulo, na
9ª posição, com 1.521 km².
A ex-subprefeita Flávia
Oliveira culpa os antigos fazendeiros pelo não desenvolvimento do distrito. Ela
acusou, num vídeo veiculado pelo Youtube, esse pessoal de ter esticado a cerca
de suas propriedades em cima de ruas e avenidas do local. “Se apropriaram de
uma terra que não era deles”.
Segundo historiadores,
quando Bento de Abreu Sampaio Vidal comprou as terras na região destinou 680
alqueires e planejou até o traçado do lugar. Até os nomes das ruas estavam
definidos. Entre elas a rua Republica que desapareceu do mapa porque um
fazendeiro resolveu esticar a cerca ali outro fazendeiro um pouco mais para lá
e assim a rua desapareceu. Até o antigo campo de futebol, que proporcionou
tantas alegrias ao distrito com o time do Dirceu Futebol Clube, foi invadido e não
existe mais.
José Lopes, um baiano que
chegou na região em 1922 e chegou a ser subprefeito de Dirceu, foi o fundador,
principal dirigente e técnico do imbatível Dirceu Futebol Clube. O filho, Sérgio
Lopes, conta que na década dos anos de 1990 e começo dos anos 2000 não tinha
chance para mais nenhum time da região. “Em todos os campeonatos dos times
entre distritos ou de bairros só dava o nosso time”, lembra Sérgio.
A filha de José Lopes,
Senhorina Lopes, conta que o pai transportava o time e boa parte da torcida na
carroceria aberta de um velho caminhão Ford por estradas empoeiradas da região.
Era um tempo em que não havia restrições para esse tipo de transporte. Na casa
da família existe um cômodo ainda repleto de troféus e taças conquistados pelo
fabuloso time do distrito.
Outro grave problema do
distrito é o esgoto correndo a céu aberto pela avenida Sampaio Vidal, nome homônimo
da avenida principal da cidade de Marília. E nem todas as casas possuem fossas
sépticas. Bento de Abreu Sampaio Vidal leva o título de fundador do distrito de
Dirceu e da cidade de Marília e denominou os lugares com base no livro “Marília
de Dirceu”, do poeta e inconfidente mineiro Thomaz Antônio de Gonzaga.
Além do asfalto, os
moradores das cerca de 30 casas que ainda restam no distrito reclamam da falta de
uma área de lazer em Dirceu. Não existe escola e nem uma quadra poliesportiva
para a prática de atividades esportivas. Tem quem também reclama que no local
não existe nem um cabeleireiro ou barbeiro para cortar o cabelo dos moradores.
Quem precisar cortar os cabelos, precisa procurar outros lugares.
Sampaio Vidal, em 1926,
cedeu terras para a passagem dos trilhos da Companhia Paulista que avançava na
região e fundava outro vilarejo, elevado à condição de distrito de Cafelândia
no final daquele ano e já com o nome de Marília, em alusão à obra “Marília de
Dirceu”, do poeta mineiro Thomaz Antônio Gonzaga. O trem chega em Marília em dezembro
de 1928 e distrito é elevado à categoria de município, sendo instalado em 4 de
abril de 1929.
O distrito de Dirceu é cerca
de 10 anos mais antigo do que a cidade de Marília. No entanto não progrediu. E
até hoje não possui acesso pavimentado para chegar até o local. Em 1944, por
meio do Decreto-Lei 14.334, o território de Dirceu foi aumentado com anexação
do extinto distrito de Santa Inês, do distrito de Vera Cruz. O local expandiu
por alguns anos. Chegou a ter duas vendas, muito procuradas pelos moradores da
região.
A professora e historiadora
Rosalina Tanuri contou em seu livro e vários de seus artigos sobre as remitências
de Marília, que o córrego Cincinatina atraia moradores de toda a região, que aos
finais de semana se dirigiam ao local para pescar ou banhar-se nas águas limpas
e cristalinas. Hoje o local é impróprio para nadar e nem peixes tem mais, devido
a poluição de esgoto não tratado e despejado no córrego.
Valdemir Felix, ex-antigo morador de Dirceu, escreveu pelas redes sociais, dos bons tempos em que morou no local. “Estudei em 1994 na antiga escola do distrito e posso dizer que conheço praticamente todos os dircenses. Tenho muita saudade de todos eles”.
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Um dos bares de Dirceu, único meio de lazer e diversão do distrito |
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Primeiro planejamento dos lotes e vias do distrito, datado de 1915 |
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Time do Dirceu Futebol Clube, durante participação em seu último campeonato em 2016 quando foi campeão do Campeonato Inter-distritos |
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Estrada de 8 km que dá acesso ao distrito de Dirceu |
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Capela no distrito de Dirceu |
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Capela do distrito de Dirceu |