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Jornalista Sérgio Fleury Moraes, editor do Debate, morre aos 64 anos

  

Sérgio Fleury era considerado como um ícone para o jornalismo brasileiro

O Brasil perdeu neste final de semana um dos maiores ícones da imprensa brasileira. Sérgio Fleury Moraes, fundador do jornal Debate e precursor do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que derrubou a famigerada Lei de Imprensa. Há 46 anos ele fundou e mantinha o Debate, jornal combativo e independente que contou entre seus colaboradores com Fernando Henrique Cardoso, Miguel Abeche, Fernando Morais, Flávio Bierrenbach, entre outros colunistas. Ultimamente as páginas do Debate também contavam com colaboração do jornalista Nelson Gonçalves, editor da Folha2.

Sérgio Fleury lutava contra um câncer e faleceu em Jaú no Hospital Amaral Carvalho, onde estava internado após ser transferido da Santa Casa de Santa Cruz do Rio Pardo. O velório está sendo realizado na Câmara Municipal de Santa Cruz do Rio Pardo e o sepultamento será, neste sábado, às 16h, no cemitério da cidade.

Desde muito jovem, ele sempre despertou atenção para o jornalismo. Teve de ser emancipado aos 17 anos para poder montar sua própria empresa jornalística. Muito combativo e independente, nunca deu trégua para as injustiças e irregularidades.

Em um dos casos mais emblemáticos envolvendo abuso de autoridade e censura foi quando Sérgio denunciou um juiz da cidade, que tinha aluguel da casa e do telefone pagos pela prefeitura de Santa Cruz do Rio Pardo, numa época em que alugar uma linha de telefone era muito custoso e que nem o Corpo de Bombeiros da cidade conseguia uma linha telefônica. Uma linha de telefone custava nessa época quase o preço de um automóvel. E era uma prática muito comum, nos tempos da ditadura militar, alguns juízes, delegados de polícia e até sargentos do Tiro de Guerra exigiram das prefeituras que arcassem com suas moradias, veículos, telefone e até alimentação.

O Tribunal de Contas soube do caso através do “Debate” e fez com que a prefeitura parasse com o pagamento do aluguel da casa e do telefone do juiz. Depois do acontecido, o juiz abriu um processo contra o jornalista e começou a persegui-lo.

Em 1992, na época das eleições para prefeito de Santa Cruz do Rio Pardo, um dos candidatos estava sendo acusado de ter mais dívidas do que o orçamento do município. Sérgio decidiu apurar a informação e descobriu que as dívidas eram reais. Depois de publicar a notícia, o juiz proibiu o “Debate” de publicar informações sobre os candidatos.

Sérgio interpretou aquilo como censura, e como a censura foi proibida pela constituição de 1988, continuou a investigar o caso e a publicar no jornal. A ação do jornalista foi considerada desobediência. O processo correu, os anos passaram e em 1996 ele foi preso durante 19 dias na sala da carceragem da delegacia e os outros 6 meses em prisão domiciliar, por ter desobedecido o juiz 4 anos antes.

 Mas nem isso o impediu de continuar com o jornal, ele foi proibido de trabalhar durante os 19 dias que ficou na carceragem, mas saiu escondido na carroceria da caminhonete do pai para trabalhar de madrugada e conseguir terminar a edição do jornal. Muitos advogados foram envolvidos no caso, mas apenas depois da publicação do artigo “Macondo é pertinho”, de Clóvis Rossi, na página 2 do jornal Folha de S. Paulo, é que o caso ganhou visibilidade e Sérgio conseguiu a liberdade.

Caso ganhou repercussão nacional

 O ocorrido teve repercussão nacional e fomentou o debate sobre a Lei de Imprensa, que estava em vigor desde 1967, no ápice da ditadura, e que não condiz com o período democrático. Sérgio Fleury foi convidado para o programa do Jô, para dar entrevistas para diversos canais de TV, escreveu artigos para a Folha e O Globo, onde teve meia página do primeiro caderno para expor sua opinião.

A Lei da Imprensa foi derrubada em 2009 e Fleury foi uma das fagulhas que transformou o assunto em pauta. Sérgio Fleury Moraes foi o retrato do jornalismo do centrooeste paulista, sempre movido pelo sonho e pela vontade de investigar o poder público. Mesmo acumulando inúmeros processos ao longo da carreira, o jornalista nunca se intimidou. Sua coragem impressa no Jornal Diário dos domingos vai deixar saudade. Fica a lição de jornalismo sério e imparcial.

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Sérgio Fleury concedendo entrevista no programa do Jô Soares

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