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Pedro Brasileiro de Saisset, filho bastardo de Dom Pedro 1º (foto: Divulgação/Museu de Saisset, da Universidade de Santa Clara)
Nelson Gonçalves, especial para a Folha2
Filho bastardo do imperador Dom Pedro 1º, Pedro de Alcântara Brasileiro de Saisset, nasceu em Paris, mas viveu e prosperou na Califórnia, nos Estados Unidos. No Vale do Silício, os norte-americanos conhecem mais do que os brasileiros a história dessa figura que é prestigiada e enaltecida, até os dias atuais, com um museu mantido pela Universidade de Santa Clara.
Dom
Pedro 1º sempre teve casos extraconjugais. Era galanteador e teve várias
amantes e filhos fora do casamento. A mais conhecida foi Domitila de Castro, a
famosa Marquesa de Santos, que fora casada com Tobias de Aguiar, chefe da
Guarda Imperial, considerado o patrono da Polícia Militar paulista e dá nome ao
Batalhão de Choque de São Paulo, a famosa ROTA (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar).
Contam alguns historiadores que quando o imperador queria ficar mais à vontade
com a marquesa encarregava Tobias, o marido, para levar alguma correspondência,
a cavalo, até Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Eram quase dois meses de
percurso para ir e outros dois meses para regressar. Para Domitila, Dom Pedro mandou
construir a Casa Amarela, um palacete que hoje abriga o famoso Museu do Primeiro
Reinado, no bairro Alto da Boa Vista no Rio de Janeiro.
Antes,
quando tinha 18 anos, teve um caso duradouro com uma dançarina francesa chamada
Noémi Thiery, que teve uma criança natimorta
dele. Seu pai, dom João 6º, tratou de enviar a dançarina para fora do Brasil
para que ela não ameaçasse o noivado de Pedro com a arquiduquesa Maria Leopoldina,
filha do imperador da Áustria, Francisco 1º.
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Dom Pedro 1º, primeiro imperador do Brasil, em quadro pintado em óleo sobre tela, mostrando ao fundo o morro do Pão do Açúcar do Rio de Janeiro |
Após
a morte da primeira esposa, a imperatriz Maria Leopoldina, cuja morte paira
suspeitas de que teria sido empurrada nas escadarias do palácio onde vivia para
parecer uma queda acidental, Dom Pedro 1º se sentiu mais livre e solto para
suas aventuras amorosas. Era um mulherengo incorrigível. Estudiosos relatam que
quase todo o Rio de Janeiro comentava as constantes idas do imperador ao
sobrado do casal de comerciantes da alta costura e moda, Pierre Joseph Felix
Saisset e Henriette Josefhine Clemence de Saisset.
A
constância e assiduidade nas visitas à casa da madame Henriette, sempre nas
ausências do marido, alimentaram o disse-me-disse na rua do Ouvidor durante
meses. Pierre Saisset saia sempre ao amanhecer em direção ao porto para voltar,
no final da tarde, carregando grandes baús com as últimas novidades da moda,
vindas de Paris.
Provavelmente o francês sabia dos encontros da esposa com o imperador. Henriette engravidou. Ao saber, Dom Pedro 1º ficou aflito, pois se já enfrentava dificuldades para arranjar alguma pretende da nobreza por conta da reputação de ser infiel, o que seria se descobrissem que uma amante sua estava grávida? Princesas de várias nações recusaram propostas de casamento, uma depois da outra, devido a sua má reputação. Então ele entrou em acordo com o casal, assinando a garantia de pensão anual para o filho, a amante e o marido dela.
Assim no dia 1º de dezembro de 1828, eles
embarcaram num navio rumo à Europa. No bolso, o marido levava uma nota
promissora para ser compensada pelo banqueiro Rothschilds, no valor de 75 mil
francos (equivalente hoje a quase meio milhão de reais), a título de reparos
pelos arranjos com a saída repentina do Brasil. Na barriga, a esposa carregava
um filho com o DNA de Dom Pedro 1º, o Imperador do Brasil.
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Saisset Museum, localizado na cidade de Santa Clara, Califórnia, nos Estados Unidos, presta homenagem o filho bastardo do imperador Dom Pedro 1º |
Pedro
Alcantara Brazileiro de Saisset estudou Direito e quando estava prestes a completar
18 anos, para fugir de ser convocado para servir o exército francês, resolveu
vir para o Brasil para cuidar dos negócios da família na rua do Ouvidor, no Rio.
A intenção do pai Pierre Feliz Saisset é que eles se revezassem, ficando alguns
anos em Paris e outros no Rio de Janeiro.
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Na rua do Rosário, no centro do Rio, ainda mantém em pé a Galeria onde a família Saisset tinha o seu atelier de alta costura e moda e tanto encantou Dom Pedro 1º |
Quando
Pedro de Saisset chegou ao Brasil completava 16 anos que Dom Pedro 1º tinha
deixado o país. E tinha falecido 13 anos antes, em 1834 em Portugal, com apenas
37 anos de idade.
Em
fevereiro de 1849, sem qualquer aviso à família, Pedro de Saisset segue para o
porto do Rio de Janeiro e embarca num navio rumo à Califórnia. Fez uma escala
em Valparaiso, no Chile, e chega depois de cinco meses na Califórnia. Foi furtado
durante a viagem e lhe subtraem todo seu dinheiro e pertences.
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Jornalista Tina Evaristo que já trabalhou no Correio Brasiliense e ganhou um Prêmio Esse é autora de intensa pesquisa sobre o filho de Dom Pedro 1º que fez fortuna nos Estados Unidos da América |
Fortuna
nos EUA
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Filho bastardo de Dom Pedro 1º foi um dos pioneiros da cidade de Santa Clara, na Califórnia, Estados Unidos |
Fluente
em francês, português e inglês, trabalhou no porto da Califórnia como
carregador e vendedor de mercadorias. Fazia de tudo um pouco. Trabalhou muito e
assim construiu uma nova vida, longe de Paris, longe do Rio de Janeiro num
mundo muito distante. Lá ele viveu por mais de cinco décadas. Casou-se com
Maria Palomares, que já tinha três filhos, e com ela teve outros quatro. Criou
os sete filhos.
Com
seu talento empreendedor para o mundo dos negócios o levou a se envolver com a compra
e venda de terrenos e propriedades agrícolas. Fez fortuna como empresário,
fundou e presidiu a Brushu Eletrict Ligth Company, uma importante companhia
americana de fornecimento de energia e atuou como agente consular da França. A Brushu fundiou-se depois com outras empresas para formar a General Eletric. Saisset se tornou pessoa bastante conhecida e integra.
Integrou, inclusive, o grupo de pioneiros do Estado, sendo inúmeras vezes
homenageado.
Ele
se afastou da sua família em Paris, apesar de insistentes cartas do pai Pierre
e da mãe Henriette para que regressasse para visita-los. Sua relação com sua
mãe azedou-se ainda mais quando comunicou seu casamento com uma viúva, mãe de
três filhos. Sua mãe desaprovou o casamento.
Os
pais, segundo cartas resgatadas, passaram por dificuldades financeiras, já que
o imperador Dom Pedro 1º não cumpriu com promessa de ajuda-los financeiramente
por toda a vida. Em agosto de 1834, Henriette de Saisset escreveu uma longa
carta, com seis páginas para Dom Pedro, que nessa altura já não era mais 1º e
sim Dom Pedro 4º, rei de Portugal, após lutar contra seu irmão Miguel até a
morte para tirá-lo do trono. Da infância à vida adulta, Miguel e Pedro nunca
foram amigos. “Nem por um só instante eu imaginei que Vossa Majestade não cumpriria
as vossas promessas reais”, escreveu Henriette. “Para mim elas eram sagradas,
tanto que depositei total confiança nelas”. Provavelmente Dom Pedro, pai de seu
filho fora do matrimônio, nunca recebeu ou leu essa carta da amante reclamando do desamparo ao
filho bastardo.
Depois
da morte de Dom Pedro, em 1834, o casal Saisset passou por enormes dificuldades
financeiras. Resolveram romper o sigilo e contaram a toda a verdade para a viúva,
dona Amélia. Dela então receberam uma parte adiantada da herança que o imperador
do Brasil havia deixado para seu filho em testamento.
Alguns historiadores acreditam que Pedro Saisset teria escrito para seu irmão, Dom Pedro 2º, três anos mais velho. No entanto não há confirmação de que este tenha respondido ao contato do irmão e se depois se encontraram. Dom Pedro 2º chegou a visitar a Califórnia alguns anos depois e os dois podem ter se encontrado nessa ocasião. Mas o monarca não registrou nada a esse respeito em seu diário, como fazia de costume.
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Visitantes observam quadros no Museu dedicado à família Saisset na Universidade de Santa Clara, nos Estados Unidos |
Para mais informações acesse o site da Universidade Santa Clara e o blog da jornalista Tina Evaristo que traz muitas informações sobre Pedro de Saisset