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Hidraurio, loja de materiais de construção, emprega dois venezuelanos

Venezuelanos Roberto Ochoa e Francisco Urbaneja trabalham na Hidraurio, loja de materiais para construção no Jardim São Francisco em Rio Preto

 Trabalhando entre sacos de cimento, montes de areias e de pedras, fios elétricos, com outros materiais hidráulicos e de construção civil, dois venezuelanos passariam desapercebidos se não fosse o sotaque espanhol entre os demais funcionários da Hidraurio. Milton de Carvalho, dono da loja de materiais de construção localizada na avenida Getúlio Vargas, no bairro Tangará, em São José do Rio Preto, é também dono de um imenso coração de bondade e de uma energia que ilumina a todos que se aproximam. "Não nos custa nada de extraordinário em ajudar nossos 'hermanos'", diz Milton.

Faz dois anos e meio que os venezuelanos trabalham na empresa. Foram contratados após entregarem currículos na Hidraurio solicitando oportunidade de emprego. São eles que contam os fatos que levaram a abandonar o país onde viviam e como vieram parar na cidade para se empregar numa loja de materiais de construção. Roberto Ochoa, de 30 anos, se formou engenheiro civil em Caracas, sua terra natal e capital da Venezuela. Entristecido por não encontrar emprego em seu país, Roberto resolveu seguir o caminho percorrido, alguns anos antes, pelo seu irmão Rafael Antonio, médico que se especializou em radiologia e veio trabalhar no Brasil.

“A situação na Venezuela está muito ruim e vem piorando a cada ano”, informa. “A forma de governo socialista imposta pelo governo não é boa. Desde quando intervieram e começaram a estatizar, várias empresas saíram do país, causando desemprego, fome, falta de atendimento médico e muitos conflitos. Quase todos os dias tem protestos nas ruas e a gente corre o risco de levar um tiro sem saber o porquê”.

Roberto informou que inicialmente pretendia fixar residência na Argentina, mas com a vitória do socialista Alberto Fernandes, em 2019, não quis correr o risco de ter de enfrentar os mesmos problemas ocorridos em seu país. “Achamos melhor aprender uma nova língua e termos novas oportunidades no Brasil”.

O que, para muitos, poderia ser visto como um rebaixamento profissional é para Roberto a grande oportunidade de recomeço. “Estamos trabalhando honestamente e vemos com muita satisfação e alegria empresas como a Hidraurio nos abrir as portas para uma grande oportunidade de recomeço”, analisa.

Sede da Hidraurio, na avenida Getúlio Vargas, no bairro Tangará


Outro venezuelano que trabalha há mais de dois anos na Hidraurio é Francisco Urbaneja Filho, de 28 anos. Natural de Barcelona, cidade de 620 mil habitantes, capital do Estado de Anzoátequi, localizada no norte da Venezuela e próxima do mar do Caribe, mas que também sentiu na pele as dificuldades de se viver em país ditatorial. “Trabalhava lá com vendas em comidas para restaurantes, mas chegamos num ponto que já não tínhamos mais o que comer”, lembra Francisco.

Em São José do Rio Preto Francisco iniciou uma nova vida. Casou-se com a também venezuelana Soliber e o casal acaba de ter o primogênito Santiago. “Nosso filho tem quatro meses”, informa, dizendo estar muito feliz trabalhando na Hidraurio. “Meu sonho agora é um dia poder comprar uma casa própria para morar”.

Os dois venezuelanos contam que deixaram tudo para atras no país de origem. “Lá a gente vivia em sobressalto”, conta Roberto, lembrando que não tinham emprego e nem o que comer. Ele disse que toda sua família, pais e outros seis irmãos, imigrou para o Brasil. “Ainda temos casa em Caracas, onde ficou uma tia e uma prima tomando conta para ser vendida”.

Enquanto falava com a reportagem, Roberto recebeu mensagem no celular informando a morte de 43 pessoas num conflito em Caracas. “Lá é quase todos dias assim. Tem protestos por todos os lados. E nós não queremos saber de protestos. Queremos simplesmente trabalhar”.

 

O venezuelano Roberto Ochoa trabalha na Hidraurio é engenheiro civil e membro da Igreja dos Mórmons

Religião

A diferença entre os dois venezuelanos é que Roberto é membro da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, popularmente conhecida como mórmons, e Francisco, embora acredite em Deus, não frequenta nenhuma religião. “Ainda vou convertê-lo para a igreja”, brinca Roberto.

Na Hidraurio os dois lembram que entregaram currículo pedindo oportunidade de emprego. Semanas depois foram chamados para cobrir férias de funcionários e, devido eficiência e dedicação, ambos acabaram sendo contratados com registro em carteira e todos os direitos profissionais.

O empresário Milton de Carvalho abriu o coração e as portas da sua emprega para empregar venezuelanos


Milton de Carvalho afirma que está bastante satisfeito com o trabalho dos venezuelanos. “São bons funcionários, nunca tivemos reclamação dos clientes”, diz o comerciante, que é presidente da Acomac (Associação dos Comerciantes de Materiais de Construção) de São José do Rio Preto e Região e também vice-presidente financeiro da Anamaco (Associação Nacional dos Comerciantes de Materiais de Construção). O empresário não descarta a contratação de outros na mesma situação: “Caso uma pessoa chegue com vontade e queria trabalhar, havendo vagas, a casa estará aberta”.

 

Francisco Urbaneja é casado e pai de uma criança de 4 anos. Recomeçou há dois anos e meio uma nova vida no Brasil e agradece à Hidraurio pela oportunidade

Imigração

 Segundo dados divulgados pelo Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) a imigração Venezuelana no Brasil cresceu exponencialmente nos últimos anos. O número de solicitantes de permanência no país passou de 829, em 2015, para 3.368, em 2016, e 7.600 em 2017. No final de 2020 havia 57.099 venezuelanos vivendo no Brasil.

 


Ditadura venezuelana

 Muitos falam dos terrores e horrores da Venezuela sem conhecer direito os fatos que levaram o país vizinho a chegar nessa situação. Tudo começou com a eleição do emblemático Hugo Chaves, que governou o país por 14 anos seguidos, de 1999 a 2013.

 Nascido em Sabaneta, pequena cidade do interior, aos 17 anos Hugo Chaves ingressou na Academia Militar da Venezuela e lá seguiu carreira. Graduou-se em 1975 e atingiu o posto de tenente-coronel do exército. Depois de uma tentativa de golpe militar malsucedido em 1992 contra a presidência de Carlos Andrés Péres, Chaves foi eleito em 1998 como presidente da Venezuela pelo voto popular, assim como Adolfo Hitler na Alemanha, considerado como o “salvador da pátria” contra a corrupção e desmandos no país.

 Assumiu a presidência inicialmente para um mandato de quatro anos, pondo fim a quatro décadas de domínios dos chamados partidos tradicionais. Foi eleito com discursos centrados no combate à pobreza e à corrupção.  Sempre falando aquilo que o povo queria ouvir, conseguiu esticar o mandato para seis anos e depois foi reeleito vencendo os pleitos de 2000 e 2006.



Popularidade com mentiras 

Hugo Chaves conseguiu enorme popularidade e os partidários dele conquistaram 120 das 131 cadeiras do Congresso. Justificaram as rupturas constitucionais para defender o combate à corrupção, a inflação e o desemprego. Só mentiu. E não fez nada do prometido. Em razão disso, em 2002 ele também foi vítima de uma tentativa de golpe. A comunidade internacional, inclusive o Brasil na gestão de Fernando Henrique Cardoso, ajudou a coordenar o golpe. Mas Hugo Chaves acabou voltando fortalecido ao poder três dias depois. Mediante plebiscito para saber se continuava ou não no poder venceu o referendo por maioria esmagadora.

 Governou com mãos de ferro, acusado de desrespeitar adversários e a constituição do país. Cancelou concessões de rádios e tvs. Censurou a imprensa e passou a perseguir inimigos. Foi acusado de tornar a Venezuela um país comunista. Embora era constante afirmar em seus discursos, da boca prá fora, de que “não há ditadura aqui”.

 Estatizou empresas e demitiu gestores dos bancos e da companhia estatal petrolífera. Substituiu todos por pessoas da sua confiança. E também tentou intervir no Judiciário, nomeando juízes de sua confiança para a suprema corte.

 Adotou políticas que minaram direitos humanos e estabeleceu postura desafiante em relação aos Estados Unidos e até com países vizinhos, como a Colômbia e até com o Brasil. Casou duas vezes, teve três filhos e também casos extraconjugais. Todos acusados pelos opositores de enriquecimento ilícitos. E ainda tem, até hoje, grupo de fanáticos apoiadores, que se reúnem em grupos armados.

 Hugo Chaves faleceu, aos 58 anos de idade, em março de 2013. Mas deixou como sucessor seu fiel seguidor: o ex-maquinista do metrô de Caracas, Nicolas Maduro. Que continua seguindo à risca, com grupos armados, a política econômica e de convencimento e ódio contra seus opositores.



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