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Pomada Minancora é conhecida em todos os lares brasileiros desde 1912 |
Nelson Gonçalves, especial para a Folha2
Quem tem mais de 30 anos certamente guarda em sua memória as recomendações positivas para usar Minancora, a pomada quase milagrosa que servia para tudo. As indicações dela eram para o tratamento de espinhas, frieiras, urticárias, escaras, pequenos machucados superficiais, picadas de inseto e até para mau cheiro nas axilas e para disfarçar o chulé nos pés.
A pomada foi criada em 1912 pelo farmacêutico português Eduardo Augusto Gonçalves. Ele chegou ao Brasil com 25 anos e trabalhou em Manaus (AM) na fabricação do polvilho antisséptico Granado, quando conheceu a diversidade da fauna e da flora brasileira. Encontrou ali matérias-primas que mais tarde serviriam para a produção dos seus remédios populares.
O polvilho antisséptico Granado, criado por João Bernardo e pelo seu irmão José Antônio Coxita Granado, na Pharmácia Granado, que em 1870 atendia a família real de Dom Pedro 2º. A fórmula, aprovada por Oswaldo Cruz, tornou-se um ícone da marca e continua inalterada. Conhecida até hoje por combater assaduras, brotoejas e odores da transpiração, além de prevenir pruídos e frieiras.
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Os ingredientes constantes na fórmula da centenária pomada Minancora |
113 anos de história
Em 1912, o farmacêutico Eduardo Augusto Gonçalves chegou a Joinville (SC) para trabalhar como gerente da Farmácia Doelich, a primeira da cidade. Lá conheceu a jovem Adelina Moreira, com quem se casou dois anos mais tarde. Ao lado de Adelina começou a fabricação caseira de uma pomada antisséptica, a base de cânfora, cloreto de benzalcônio e óxido de zinco, que batizou com o nome de Minancora. O nome é um acróstico dos nomes Minerva, a deusa grega da sabedoria, e âncora, que aludia à sua permanência definitiva no solo brasileiro.
Em 1915 ele registrou a fórmula e começou a viajar pelo Brasil para popularizar a pomada milagrosa, capaz de curar uma série de enfermidades, desde frieiras e escaras, espinhas e pequenos ferimentos superficiais, inclusive os causados pelo barbear, como ainda hoje se estampa em sua embalagem. Aliás a embalagem se mantém praticamente a mesma desde o início com a sua embalagem na cor laranja com o desenho da deusa Minerva e da âncora estampadas na frente. Na parte de trás as indicações para que serve o produto.
Durante suas viagens, Adelina fabricava os produtos artesanalmente. Além da pomada, Eduardo também produzia uma espécie de xarope indicado para a cura da embriaguez. As propagandas divulgadas nos jornais da época diziam a pomada era cura para todos os males da pele e que o “Remédio Minancora Contra a Embriaguez tem dado alegria e felicidade a milhares de famílias que viviam na maior miséria causada pelo triste vício”. E os produtos podiam ser encontrados nas “boas pharmácias” (no tempo que farmácia era escrito com “ph”).
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Prédio construído em 1929 para ser sede da Minancora foi tombado pelo patrimônio histórico |
Prédio tombado
Em 1929, Eduardo construí a sede da empresa, que abrigou a farmácia de sua propriedade e também a indústria, ambas levando o nome Minancora. O prédio, de dois andares, também servia de moradia à família e mais tarde foi tombado pelo patrimônio histórico-cultural da cidade de Joinville. Motivo pelo qual a fachada é preservada até os dias atuais.
“A farmácia era muito bonita e charmosa”, contou dona Jutta Hagermann, durante entrevista em 2012 para um jornal de Santa Catarina que informava o fechamento daquele estabelecimento comercial depois de 83 anos de atividades. “O prédio de dois andares por si só já chamava a atenção. Mas a beleza da parte interna chamava ainda mais atenção pelos móveis escuros, os balcões, os armários de madeira maciça. Era uma farmácia bonita e diferente. Tinha até um bercinho de madeira para pesar as crianças na balança”.
Alguns anos antes, após a morte de Eduardo em 1977 aos 92 anos, a filha Lady Gonçalves Dória, deixou somente a farmácia funcionando em Joinville e mudou a fábrica da Minancora para Pirabeiraba, distrito de Joinville. Para lá transferiu também toda a administração. Os negócios da empresa são comandados atualmente pela bisneta do português, Lourdes Maria Dória. A pomada continua sendo produzida e é o carro chefe da indústria que produz uma série de outros produtos com a marca Minancora, como cremes dermatológicos para rugas e outros tratamentos.
O artista plástico Juarez Machado, que imortalizou a fachada da farmácia em um dos seus quadros, lembrou que antigamente a pomada Minancora era a “salvação da pátria”, porque “naquela época ainda não existia o desodorante” e a pomada resolvia o “problema das axilas vencidas e do pé com chulé”.
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A fórmula e a embalagem é praticamente a mesma desde 1912 |
Sinônimo de "serve para tudo"
O nome Minancora também se tornou, no linguajar popular, sinônimo de “serve para tudo”. O jornalista e escritor Sebastião Nery em seu livro “Grandes Pecados da Imprensa” conta em certos trechos do livro que “a Polícia e os órgãos repressores de antigamente utilizavam como subterfugio para sair prendendo qualquer pessoa o termo ‘comunista’, que era igual ‘minancora’, pois servia para tudo, ou melhor, para justificar todas as prisões”.
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Prédio da antiga Farmácia Minancora no centro de Joinville (SC) |
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Propaganda publicada nos jornais da época falava do Remédio Contra Embriaguez |
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Polvilho Granado é outro produto que está no mercado há mais de 100 anos com a mesma fórmula e a mesma embalagem |