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Gonçalves Ledo, um brasileiro injustiçado

 

Gonçalves Ledo é considerado como o grande mentor da independência do Brasil das mãos de Portugal

Joaquim Gonçalves Ledo foi seguramente um dos maiores brasileiros de sua época e tem sido bastante injustiçado na História do Brasil, já que os historiadores, de maneira geral, pouco o citam no movimento que culminou com a independência do País. E não tem como falar de Gonçalves Ledo sem falar de José Bonifácio, com quem travou ao longo de sua vida grandes dissidências de pensamentos, posicionamentos políticos e de ideais. Sabe aquela história de que papagaio come o milho, mas periquito leva a fama? É mais ou menos isso que aconteceu na história do Brasil com esses dois personagens.

 Gonçalves Ledo foi homem extraordinariamente modesto, avesso a exibições, trabalhou incansavelmente pela libertação do Brasil com sincero amor e não por ambição de cargos, títulos ou honrarias, que recusou inúmeras vezes no governo na Maçonaria. Não é à toa que existam hoje mais de 12 lojas maçônicas com o nome de Gonçalves Ledo e apenas uma com o de José Bonifácio, em Santos, sua terra natal.

 Em que pese todos seus méritos, conhecimentos, inteligência e ligações políticas, José Bonifácio de Andrada era muito astuto e aproveitador. Nascido em Santos, oriundo de família rica, mudou-se para Portugal quando tinha 14 anos e lá se destacou, por mais de 30 anos, como servidor da Corte. Comissionado, às custas do erário público, viajou por toda a Europa, obtendo reconhecimento internacional na descoberta de quatro minerais, incluindo a petalita, batizada como andradita em sua homenagem, que mais tarde permitiria a descoberta do elemento lítio.

Fazenda Sumidoro

Ruinas da capela da Fazenda Sumidoro, onde viveu Gonçalves Ledo (foto  feita em 2015 pelo Prof. Deivid Antunes da Silva)

Gonçalves Ledo nasceu na Fazenda Sumidoro, no município fluminense de Cachoeiras do Macacu. Filho de comerciantes de classe média também seguiu aos 14 para estudar em Portugal. E foi lá na terra de Camões que José Bonifácio e Gonçalves Ledo se conheceram. O primeiro trabalhava para o governo e arregimentava jovens nas universidades para integrar o batalhão de defesa de Portugal contra a invasão das tropas de Napoleão Bonaparte.

Em carta escrita ao seu irmão Custódio, Ledo informava que se recusava a lutar pelo país que derramou sangue de seus compatriotas, como Tiradentes e tantos outros. Essa carta faz parte do acervo da Biblioteca Nacional. Em 1820, dois antes da proclamação da Independência, o rei Dom João 6º nomeou José Bonifácio, monarquista convicto, como conselheiro da Corte. Tem vários artigos dele em jornais da época defendendo ideia de manter a união com Portugal, dentro de um sistema de reino unido.

Foi Gonçalves Ledo quem ajudou a fundar a primeira loja maçônica no Rio de Janeiro. Mas Dom João 6º, do qual Bonifácio era conselheiro, proibiu todas as atividades da Maçonaria e mandou prender todos seus líderes, entre os quais Gonçalves Ledo que posteriormente conseguiu sua absolvição.

Gonçalves Ledo se uniu a José Bonifácio para ajudar a fundar o Grande Oriente do Brasil, potência maçônica da qual José Bonfácio foi primeiro Grão-Mestre. A filiação de Dom Pedro 1º e sua rápida ascensão na Maçonaria foi um duro golpe contra Bonifácio, arquitetado por Ledo. Os dois nunca se deram bem, provavelmente por ciúmes ou razões ideológicas.

Jornal Reverbero 

Jornal Revertero circulava como "porta-voz" dos ideais da independência

Junto com o padre Januário da Cunha Barbosa, Ledo criou um jornal, o Reverbero, que se tornou o “porta voz” da campanha pela independência, combatendo os interesses dos portugueses. Enquanto isso, Bonifácio defendia a monarquia e mantinha profundos laços de interesses com Portugal. Argumentava que a unidade cultural e política seria mantida com a monarquia de um reino unido Brasil-Portugal e criticava a América espanhola, que era republicana e se esfacelava em vários países.

 Foi Gonçalves Ledo que reuniu assinaturas a favor da independência e redigiu manifesto pedindo a proclamação da Independência do Brasil. “É inaceitável que sejamos governador por um ei, que vive a milhares de distância, além-mar, como é Portugal”. Dom Pedro 1º foi convencido então a proclamar a independência. Então com 23 anos o príncipe nomeou José Bonifácio, aos 60 anos, como seu ministro e secretário dos Negócios do Reino, tendo sido o primeiro brasileiro a ocupar cargo com plenos poderes.

Difícil convivência

Começaram então a surgir problemas com certos grupos liderados por Ledo, padre Januário e José Clemente Pereira. Aos olhos de Bonifácio, eram demagogos e agitadores e anarquistas. Tomou medidas rigorosas, determinando a prisão de todos que tiveram de fugir do país. Enquanto isso a família Andrada ocupava altos cargos no governo. Além de Bonifácio, outros dois irmãos Antônio Carlos Andrada e Martin Francisco Andrada ocupavam ministérios, sendo o primeiro ministro da Fazenda. Até a irmã deles, Maria Flora Ribeiro de Andrada fora nomeada como camareira-mor no Palácio Real.

Não demorou nem dois meses para o príncipe se dar conta dos entreveros dos Andrada. Dom Pedro demitiu em outubro de 1822 os três irmãos do ministério. Mas intenso movimento de propaganda pela volta dos Andradas fez o imperador repensar, reintegrando-os ao governo.

Bonifácio ordenou o sequestro de bens e todas as mercadorias dos portugueses nas alfandegas. Elevou o imposto de importação para 24%. Tentou coagir a imprensa. Entrou em crise com deputados e senadores. Logo surgiram protestos nas ruas contra as deportações e prisões de pessoas sem culpa. Bonifácio, o “velhaco”, como era chamado por seus adversários, caiu em descrédito. Foi preso e teve de ficar exilado por cinco anos.

No exílio, na Espanha, foi impiedoso com Dom João 6º, a quem chamou de “João Burro”, e com Dom Pedro 1º, a quem comparou com Pedro Malsartes. Considerava um insulto o fato de Dom Pedro ter outorgado a sua amante Domitília de Castro o título de Marquesa de Santos, justamente a cidade onde nascera.

Em 1829 foi permitido a José Bonifácio retornar ao Brasil. Chegou, carregando o cadáver da esposa, que morreu no navio durante a viagem. O ministro do império era seu adversário José Clemente Pereira.

Tutor de Dom Pedro 2º

Com a abdicação de Dom Pedro 1º , em 7 de abril de1831, Dom Pedro 1º foi complacente nomeando-o como tutor do seu primogênito. Podia nomear os mestres e mordomos. Acabou brigando com Mariana Carlota de Verna Magalhães Coutinho, a quem os príncipes consideravam uma segunda mãe, e foi demitido do cargo. Logo se tornou suspeito de tentar tramar a volta de Dom Pedro, que nessa altura já era rei de Portugal, para comandar novamente o Brasil. O ministro da Justiça Diogo Feijó o acusou formalmente. Ficou recluso, até a morte, na ilha de Paquetá.

Sem ressentimentos

Quando Bonifácio morreu Ledo escreveu sobre a perseguição implacável que esse lhe fizera durante toda sua vida. “Meu prestigio popular lhe fazia mal. E por isso tributou-me o mais infernal ódio que uma criatura humana pode ter. Combateu-me por todos os meios possíveis, confiscou-me propriedades, expulsou-me da minha pátria, caluniou-me, tirou de sua inteligência a mais ferina sátira à minha reputação. Fez-me todo o mal que pode, mas morreu agora e a última pá de terra jogada pelo coveiro levará o meu último ressentimento e nada mais direi sobre esse grande espírito que se apagou”.

Legado enaltecido 

Monumento erguido em memória de Gonçalves Ledo, na capital paulista

O legado de Gonçalves Ledo é enaltecido pelo historiador Afonso de Taunay que o considera como o “grande articulador da independência brasileira’ e pelo Barão do Rio Branco que deixou escrito que fora Ledo quem instigou Dom Pedro a proclamar a independência e ajudou a redigir a primeira Constituição. O general Luiz Pereira da Nóbrega de Souza Coutinho, ministro da Guerra em 1822, deixou registrado que Gonçalves Ledo foi, incontestavelmente, o principal vulto primacial nas ocorrências que ocasionaram a emancipação política do Brasil”.


Luminoso do Colégio Gonçalves Ledo

Escola Gonçalves Ledo no município de Momarco (RS)

Parque Gonçalves Ledo, inaugurado em 1922, em Maceió (AL), durante o centenário da proclamação da independência do Brasil

Monumento, erguido em Santos, para homenagear os irmãos Andrada

José Bonifácio é considerado por alguns historiados de ter levado a fama pelo trabalho feito por Gonçalves Ledo para a a proclamação da independência

Fachada do Panteão dos Andradas, em Santos (SP)

No Panteão dos Andradas estão os restos mortais dos irmãos Andrada

Detalhe do monumento erguido em Santos para homenagear os irmãos Andrada

Conjunto de apartamentos em Maceió (AL) que leva o nome de Parque Gonçalves Ledo





 

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